Cientistas apontam 10 ações políticas para proteger polinizadores
Fonte: Estadão Conteúdo
Um novo artigo na revista Science, produzido por uma equipe internacional de 12 cientistas, com participação brasileira, aponta 10 ações políticas que os governos de todo o mundo devem tomar para proteger os animais polinizadores.
Os serviços prestados pelos polinizadores são considerados pelos cientistas fundamentais para a produção de alimentos – especialmente no caso das abelhas, que são responsáveis por polinizar mais de 50% das plantas das florestas tropicais e 73% de todas as culturas agrícolas do mundo.
Mas os polinizadores estão sofrendo um declínio de grande escala, de acordo com uma recente avaliação global realizada pela Plataforma Intergovernamental de Biodiversidade e Serviços Ecossistêmicos (IPBES) – um órgão que fornece base técnica e científica à Convenção da Diversidade Biológica, apelidado pelos pesquisadores de “IPCC da Biodiversidade”.
As 10 medidas para proteção dos polinizadores – que incluem a regulação de pesticidas, o incentivo a sistemas agrícolas diversificados e o monitoramento de longo prazo – tiveram base em um exaustivo estudo produzido pelo IPBES e foram definidas por um grupo de 12 cientistas, incluindo três pesquisadoras brasileiras.
A publicação teve a participação de Carmen Pires, da Embrapa Recursos Genéticos e Biotecnologia, Blandina Viana, do Instituto de Biologia da Universidade Federal da Bahia e Adriana Lopes, da Universidade Federal de Pernambuco.
De acordo com Carmen, o objetivo da equipe era sugerir 10 ações políticas claras e bem definidas para que os governos possam combater o problema do declínio dos polinizadores e assim proteger a produção de alimentos.
Segundo ela, o conjunto de recomendações é parte de um relatório produzido pelo IPBES, cujo resumo foi aprovado na última reunião da COP da Biodiversidade, em Kuala Lumpur e que será discutido na próxima COP, no México.
“É um documento muito robusto. Nós produzimos o sexto capítulo, que trata das políticas públicas que devem ser realizadas para reduzir os impactos sobre os polinizadores. Por isso a Science nos convidou para produzir o artigo”, disse Carmen ao jornal O Estado de S. Paulo.
A primeira das recomendações é estabelecer padrões mais restritivos na regulação dos pesticidas. “Hoje, se você observar, apenas a abelha europeia, a Apis mellifera, é utilizada para as análises de impacto de agrotóxicos. Precisamos que protocolos de outras espécies entrem nessas análises. Também é preciso avaliar os efeitos indiretos e não letais dos agrotóxicos, porque hoje só se avalia os impactos a partir da toxicidade aguda, isto é, se o produto mata ou não o inseto”, disse Carmen.
Os cientistas também recomendam promover o manejo integrado de pragas. Antes de decidir pelo uso de um pesticida, o produtor deve observar o nível de dano que realmente é causado pela praga. “É preciso monitorar. Se uma lagarta na soja não causa real dano econômico, não vale à pena aplicar o pesticida. É preciso também escolher produtos menos tóxicos para as abelhas e sempre começar pelo controle biológico: produtos químicos devem ser o último recurso.”
Os governos também devem incluir os impactos indiretos e não-letais nas análises de riscos de sementes transgênicas, além de regulamentar os fluxos de polinizadores manejados.
“No Brasil temos uma legislação para importação de agentes de controle biológico. Não se pode simplesmente trazer uma nova espécie de abelhas que não existe no Brasil sem uma avaliação de riscos. Mas, de modo geral, os países não têm essa regulamentação”, declarou Carmen.
Outra ação recomendada pelos cientistas é desenvolver incentivos para que agricultores se beneficiem ao trocar agroquímicos por serviços fornecidos pelos ecossistemas. “É preciso premiar quem protege os polinizadores, em vez de punir quem não protege. Se o produtor consegue produzir sem agrotóxicos, manter áreas de vegetação natural e controlar o uso de pesticidas, ele tem que ser incentivado.”
A polinização, segundo os pesquisadores, deve ser levada em conta pelos serviços de apoio ao agricultor, mostrando que ela é um fator central para a produção. “As empresas de extensão rural devem reconhecer a importância da polinização como um insumo agrícola importante. O serviço de extensão público tem que ser fortalecido e orientar sobre pragas, pesticidas, mas também sobre a proteção dos polinizadores.”
Os cientistas também recomendam o apoio aos sistemas agrícolas diversificados. “Nós precisamos fortalecer a agricultura de base ecológica. Vários trabalhos científicos mostram que áreas pequenas e diversificadas – com mais vegetação natural e culturas intercaladas – protegem mais o polinizador que as áreas de monoculturas. É preciso incentivar o que chamamos de ‘intensificação ecológica’”, disse Carmen.
Os governos também devem conservar e restaurar a “infraestrutura verde” – uma rede de hábitats entre os quais os polinizadores podem se mover -, em paisagens agrícolas e urbanas. “Investir na infraestrutura verde permite que os polinizadores se movam entre os ambientes. É preciso ter manchas de vegetação natural e corredores até mesmo nas paisagens urbanas – como se faz em algumas cidades americanas, onde se plantam flores melíferas nos jardins”, explicou Carmen.
As últimas recomendações consistem em desenvolver sistemas de monitoramento de longo prazo de polinizadores e financiar pesquisas sobre a melhora de rendimento na agricultura orgânica, diversificada e ecologicamente intensificada.
“Sentimos falta de dados de monitoramento de longo prazo, para saber se as comunidades de abelhas estão ou não diminuindo. Só é possível tomar decisões com esse tipo de dados.
E é preciso criar um fundo global para pesquisa para promover a agricultura que tem base na intensificação ecológica”, disse.