Jardim amigável para as abelhas: Calabura (MUNTINGIA CALABURA)

Darclet Teresinha Malerbo-Souza; André Carlos Silva Pimentel; Carlos Frederico Silva da Costa Setor de Apicultura e Meliponicultura, Departamento de Zootecnia, Universidade Federal Rural de Pernambuco

As abelhas ocupam uma posição-chave na manutenção da diversidade vegetal, por serem os principais agentes polinizadores (Villas-Bôas, 2012) e, consequentemente, são importantes na produção de frutos e sementes, mas já pensaram o que as abelhas comem?

As abelhas são totalmente dependentes das flores. Elas elaboram o mel a partir do néctar das flores, que será a fonte de energia. O pólen, coletado das flores também, será a fonte de proteínas, lipídeos, vitaminas e minerais, para o desenvolvimento das abelhas. Além disso, as plantas fornecem resinas e óleos que as abelhas vão utilizar para a elaboração da própolis, principalmente.

É extremamente importante que os apicultores e meliponicultores conheçam as espécies de plantas, no entorno das suas colônias, e o período de florescimento delas, no decorrer do ano, bem como, as espécies de abelhas que realmente visitam essas flores, além de saber o que elas coletam, se néctar ou pólen.

Isso é importante porque temos espécies que fornecem apenas pólen para as abelhas, como é o caso das mirtáceas, como goiaba e pitanga, ou como o sabiá ou sansão do campo. Já outras espécies são visitadas apenas para coleta de néctar. Ainda temos as espécies vegetais, onde algumas espécies de abelhas coletam apenas néctar e outras espécies de abelhas coletam apenas pólen.

Mesmo em áreas urbanas, podemos introduzir espécies vegetais compondo um jardim amigável para as abelhas. Pensando em espécies que podem ser inseridas nesse jardim amigável, que tem florescimento prolongado, temos a calabura (Muntingia calabura) que é uma árvore da família Muntingiaceae, também conhecida como pau-seda.

É nativa do sul do México, do Caribe, América Central, Ocidental, América do Sul, também no sul de Peru e Bolívia, as primeiras mudas foram introduzidas no Brasil, em 1962, pelo Instituto Agronômico de Campinas (IAC) com intuito de recuperar áreas degradadas. Além da recuperação de áreas degradadas é considerada fonte alimentar para diversas espécies de pássaros, aves, insetos e morcegos.

As flores são brancas, com dezenas de estames com anteras amarelas, emitindo um aroma doce e suave. Seus frutos são comestíveis e, quando maduros, apresentam coloração rosa-avermelhada, com polpa suculenta, doce e de aroma agradável, sendo consumido com casca e sementes, tanto in natura quanto como geleia ou compota. Os frutos são ricos em vitamina C, ferro e cálcio (Rahman, Fakir e Rahman, 2010).

Na América Central, a calabura produz grandes quantidades de frutas todos os meses do ano (Fleming et al., 1985). Bawa e Webb (1983) também observaram que essa planta apresenta autocompatibilidade, na Costa Rica, que permite que a calabura desenvolva grande quantidade de sementes, ao longo do ano, mesmo em áreas de degradação, onde os agentes polinizadores são escassos (Kearns e Inouye, 1993).

O doce odor e cor esbranquiçada das flores de calabura são muito atraentes para himenópteros e dípteros, o que pode contribuir para a polinização cruzada desta espécie, mesmo sendo autocompatível (Proctor, Yeo e Lack, 1996).

De acordo com Malerbo-Souza (1996), foi observada preferência de abelhas africanizadas Apis mellifera pelas flores de calabura, plantadas próximas aos maracujazeiros, mostrando seu potencial como alternativa em ocasiões que haja a necessidade do controle de pilhagem, promovido por essas abelhas, como, por exemplo, em cochos de bovinos alimentados com canade-açúcar ou em rações animais à base de milho.

Devido ao rápido crescimento e intensidade de frutificação, a calabura vem despertando grande interesse em programas de manejo de fauna, em áreas silvestres, como uma espécie de enriquecimento da flora.

Ela é muito utilizada em projetos de reflorestamento, por crescer em solos pobres e de sua propagação por meio de semente, sendo também dispersas por meio de aves e morcegos (Mora, Bertoloti e Simões, 1980; Frutas Brasil, 2016).

Figueiredo et al. (2008), em estudo realizado em áreas urbanas, verificaram que a calabura é autocompatível e apresenta autopolinização espontânea, com suas flores visitadas por abelhas e frutos consumidos por aves e morcegos fitófagos.

Um experimento foi realizado com o objetivo de avaliar a frequência, comportamento e tipo de coleta das abelhas nas flores de calabura, presentes no Setor de Meliponicultura, do Departamento de Zootecnia, na Universidade Federal Rural de Pernambuco (UFRPE), campus Dois Irmãos, localizado em Recife, Pernambuco.

Além disso, avaliar o potencial da calabura, como fonte de forrageamento para as diversas espécies de abelhas e o seu papel na manutenção da diversidade e conservação do meio ambiente.

Durante 12 meses, uma planta de calabura, próxima ao meliponário (Figura 1), foi monitorada com relação às espécies de insetos, principalmente, abelhas que visitavam essas flores. Em agosto de 2018, nessa área, foi avaliada a frequência das visitações e o tipo (néctar e/ ou pólen) de coleta das abelhas nas flores da calabura, no decorrer do dia.

Observou-se que a calabura floresceu e frutificou durante o ano todo, com alguns períodos de maior floração, como em agosto de 2018. Nesse mês, as abelhas mais frequentes nas flores da calabura foram as africanizadas Apis mellifera (65,80%), abelhas sem ferrão Tetragonisca angustula (Jataí) (26,09%) e Trigona spinipes (irapuá) (8,12%), coletando néctar e pólen.

Outra abelha sem ferrão observada foi Melipona scutellaris (uruçu nordestina) e, também, a abelha solitária Pseudaugochlora graminea. Além das abelhas, foram observados lepidópteros, dípteros e vespídeos utilizando as flores como recurso alimentar.

As abelhas africanizadas coletaram néctar (Figuras 2 e 3) e pólen, nas flores da calabura, apresentando dois picos de frequência, às 13h e às 16h00. As abelhas jataís (Figura 4) coletaram pólen nas flores da calabura, aumentando sua frequência até às 11h00, diminuindo em seguida.

As abelhas irapuás (Figura 5) coletaram pólen nas flores da calabura, com oscilações no decorrer do dia. Essa abelha pertence ao grupo dos meliponíneos, entretanto, não se utilizam seus produtos (mel, pólen, geoprópolis) devido ao seu hábito de coletar fezes e materiais em putrefação para a construção de seus ninhos. Apesar disso, essas abelhas são muito frequentes nas flores de diversas plantas, sendo generalistas e consideradas polinizadoras do chuchuzeiro (Malerbo-Souza, 1996).

Também foram observadas abelhas sem ferrão uruçu nordestina (Figura 6) coletando néctar nas flores da calabura. A planta estudada ficava bem próxima ao meliponário da Instituição. Ela é considerada a espécie de Melipona criada pelo homem, com a maior distribuição nas regiões Norte e Nordeste do Brasil, com registros do Rio Grande do Norte até Bahia.

Seu mel tem sabor agradável, menos doce que o mel das abelhas africanizadas e é uma abelha muito dócil, de fácil criação. A abelha Pseudaugochloropsis graminea pertence à família Halictidae que é uma das mais diversificadas no Brasil. Abelhas desta família apresentam brilho metálico verde, azul, avermelhado ou mesmo negro (Figura 7).

Este estudo foi desenvolvido em área urbana, onde se localiza a Universidade, mas fica próxima à uma área preservada, remanescente de Mata Atlântica (Parque Estadual de Dois Irmãos), em Recife, Pernambuco.

Estudos têm mostrado que as cidades poderiam ser reservatórios de polinizadores, com maior biodiversidade de insetos, em comparação com o campo (Jędrzejewska-Szmek e Zych, 2013). Portanto, as áreas urbanas são favoráveis aos polinizadores silvestres (Stelzer et al., 2010). Plantas ornamentais com floração em diferentes períodos, se manejados intensivamente, produzem flores e recursos (néctar e pólen) que estarão disponíveis de forma mais consistente às abelhas, mesmo em tempos de seca.

Entre as diferenças entre a paisagem rural e urbana, observa-se que a rural é caracterizada por ser um ambiente pouco transformado quando comparada com a alta biodiversidade de espécies vegetais no ambiente urbano, uma vez que as espécies da paisagem rural, comumente, se associam à agricultura, silvicultura e pecuária (Biondi e Kischlat, 2006).

Portanto, a calabura pode ser utilizada como espécie ornamental, em áreas urbanas e rurais, e deve ser plantada próxima à meliponários e apiários, sendo importante fonte de recursos alimentares para as abelhas. É considerada boa indicadora de preservação do ambiente e da diversidade de abelhas.

REFERÊNCIAS

  • BAWA, K. S.; WEBB, C. J. Floral variation and sexual differentiation in Muntingia calabura (Elaeocarpaceae), a species with hermaphrodite flowers. Evolution, v.37, n.6, p.1271-1282,1983.
  • BIONDI, D., KISCHLAT, E. A vegetação urbana e a biodiversidade. Diálogo, v. 9, p. 155-168, 2006.
  • FIGUEIREDO, R. A. et al. Reproductive ecology of the exotic tree Muntingia calabura L. (Muntigiaceae) in southeastern Brazil. Revista Árvore, Viçosa-MG, v.32, n.6, p.993-999, 2008.
  • FLEMING, T. H. et al. Phenology, seed dispersal, and colonization in Muntingia calabura, a neotropical pioneer tree. American Journal of Botany, v.72, n.3, p.383-391, 1985.
  • FRUTAS BRASIL 2016. Disponivel em: https://minhasfrutas.blogspot. com/search?q=calabura. Acesso em 01 de setembro de 2021
  • JĘDRZEJEWSKA-SZMEK, K. J.; ZYCH, M. Flower-visitor and pollen transport networks in a large city: structure and properties. ArthropodPlant Interactions, 7(5), 503–516. DOI: 10.1007/s11829-013-9274-z, 2013.
  • KEARNS, C. A.; INOUYE, D. W. Techniques for Pollination Biologists. University Press of Colorado, Niwot, CO. 583 pages, 1993.
  • MALERBO-SOUZA, D.T. Efeitos de atrativos e repelentes sobre o comportamento forrageiro da abelha Apis mellifera. Jaboticabal (SP). Tese de Doutorado (em Produção Animal), Faculdade de Ciências Agrárias e Veterinárias de Jaboticabal UNESP, 1996, 119p. MORA, Admir Lopes; BERTOLOTI, Gilmar; SIMÕES, João Walter. Espécie florestal para alimentação de fauna silvestre. Circular técnica IPEF, n. 93, p. 1-3, 1980.
  • PROCTOR, M.; YEO, P.; LACK, A. The natural history of pollination. London: Harper Collins Publishers, 1996. 479p.
  • RAHMAN, M.; FAKIR, S. A.; RAHMAN, M. Fruit growth of China berry (Muntigia calabura). Botany Research International, v. 3, n.2, p. 56-60, 2010.
  • STELZER, R. J; CHITTKA, L.; CARLTON, M.; INGS, T. C. Winter Active Bumblebees (Bombus terrestris). Achieve High Foraging Rates in Urban Britain. PLOS ONE 5(3): e9559, 2010.
  • VILLAS-BÔAS, J. Manual Tecnológico: Mel de Abelhas sem Ferrão. Brasília – DF. Instituto Sociedade, População e Natureza (ISPN). Brasil, 2012.