DESAFIOS CLIMÁTICOS NA AGRICULTURA: A CRUCIAL JANELA DA FECUNDAÇÃO E O PAPEL VITAL DA ABELHA
Carlos Pamplona Rehder Impulsionando a Inovação e o Crescimento na Apicultura, Agricultura e Biotecnologia | Líder Visionário | Transformando ideias em soluções sustentáveis
Em meio aos desafios climáticos que vêm moldando a agricultura nos últimos anos, destaco um aspecto muitas vezes negligenciado: a temperatura e seu impacto direto na fecundação das plantas. Esse fenômeno, essencial para a produção de alimentos, está enfrentando ameaças significativas devido às condições climáticas extremas que temos experimentado.
Foco principal dos meus estudos, o café, nos últimos quatro anos, tem sido afetado pelo fenômeno climático La Niña. A “janela da fecundação”, momento crítico durante a florada em que as plantas preparam-se a fecundação e assim gerar frutos, tornou-se um campo de batalha entre a natureza e condições climáticas adversas.
Visualize uma flor de café sob temperaturas escaldantes. O pólen, essencial para a fecundação, enfrenta um verdadeiro teste de resistência. Essas minúsculas partículas vivas, fundamentais para a produção de frutos, precisam germinar, crescer seu tubo polínico e transferir seu DNA e, finalmente, fecundar o óvulo. No entanto, sob calor excessivo, os resultados nem sempre são favoráveis.
Um estudo notável sobre o mamão ilustra isso perfeitamente. Com 14 variedades analisadas, torna-se evidente que o calor extremo compromete a germinação do pólen. Em condições laboratoriais (in vitro), a 45°C, apenas 55% dos grãos de pólen germinam. Contudo, em condições reais (in vivo), o mamão mais resiliente atinge 68% a 25°C, enquanto a 40°C, apenas 13% têm sucesso na germinação.
http:// bit.ly/EFEITO-DA-TEMPERATURA-NO-COMPORTAMENTO-REPRODUTIVO-DO-MAMOEIRO
Nossas plantações enfrentam desafios concretos. Cidades como Bebedouro e Botucatu enfrentam mais de 20 e 30 dias, respectivamente, com temperaturas superiores a 35°C. Votuporanga, por sua vez, sofre com 70 dias acima desse limiar. Este aumento é notável quando comparado com a década de 2000. https://bit.ly/DESAFIOS-E-TEND%C3%8ANCIAS-DO-SETOR
A urgência de medidas adaptativas não pode ser subestimada. Utilizando ferramentas como o eos.com, que fornece dados de satélite, temperaturas e precipitação, tenho acompanhado de perto as condições climáticas em fazendas, como em Patrocínio, MG e Franca, SP.
Os resultados são claros: em anos de La Niña, as temperaturas máximas ultrapassam 35°C, e em setembro de 2021, estas regiões chegaram a 40°C, criando um ambiente hostil para a fecundação das plantas.
A estimativa da Conab é uma prova disso, para o café em janeiro de 2022 previa-se 13 milhões de sacas, mas em setembro/22, a realidade foi cruel, com apenas 9 milhões de sacas, uma redução de 43%. [Fonte: Conab]
A abelha, muitas vezes subestimada, emerge como uma heroína nesse cenário. Além de seu papel crucial no transporte de pólen entre flores, ela atua como um seguro contra adversidades climáticas durante a janela de fecundação.
Em anos de La Niña, onde as temperaturas ultrapassam 35°C, a abelha se torna um aliado valioso, salvando flores que, de outra forma, seriam abortadas devido à desnaturação do pólen pelo calor e raios UV. Como será este ano de 2023 que temos El Niño? Vamos aguardar para ver.
Mas, de toda forma, ao investir em estratégias de polinização, os agricultores podem reduzir significativamente os riscos climáticos, transformando a ação da abelha em uma forma de seguro contra as incertezas climáticas durante a janela de fecundação.
O que se revela, portanto, é não apenas um desafio, mas também uma oportunidade. Projetos de polinização podem não apenas proteger as plantações, mas também se traduzir em investimentos sólidos, gerando aumento de produtividade e qualidade, de acordo com diversos estudos científicos.
Em conclusão, enfrentamos um dilema que exige atenção imediata. Com o clima se tornando mais imprevisível, a sobrevivência de nossa produção de alimentos está intrinsecamente ligada à fecundação das plantas.
Ao reconhecer a importância da abelha e investir em estratégias adaptativas, podemos não apenas superar esses desafios, mas também colher os frutos de um investimento inteligente na agricultura do futuro.