Artigo

PERFIL DOS CONSUMIDORES DE MEL DE CACHOEIRA DO SUL/RS

Rosangela Lunardi1, Chaiane Leal Agne2, Augusto dos Santos Oliveira3, Ricardo Frederico Skolaude3, Alexandre Mercino Tolotti3, Rafael Gehrke3
1Engenheira Agrônoma, Doutora, Professora na Universidade Estadual do Rio Grande do Sul (UERGS), Unidade em Cachoeira do Sul/RS. Endereço para correspondência: Rua Sete de Setembro, 1040, Centro, Cachoeira do Sul/RS, CEP 96508-010. E-mail: rolunardi@yahoo.com.br
2Acadêmica do Curso de Administração - Bacharelado na UERGS em Cachoeira do Sul/RS.
3Egressos do Curso de Administração - Bacharelado na UERGS em Cachoeira do Sul/RS.

RESUMO

O mercado brasileiro de consumo de mel ainda tem muito a crescer. Cada brasileiro consome, em média, cerca de 60 gramas de mel/ano, pois seu consumo ainda está muito associado a questões medicinais. Em vista disso, realizou-se um trabalho com o objetivo de traçar o perfil sócio-econômico e cultural dos consumidores de mel em parceria com a Associação Cachoeirense de Apicultores (ACAPI), em Cachoeira do Sul/RS, no período de setembro a dezembro de 2004. Para isto, tomou-se uma amostra de 349 consumidores escolhidos aleatoriamente em 33 bairros do município, representando 0,4% da população da zona urbana. Para a coleta das informações utilizou-se um questionário estruturado. Dos entrevistados, 62,7% eram do sexo feminino. Quanto ao nível de instrução, 35,5% dos entrevistados possuíam apenas o primeiro grau incompleto. A maior parte das famílias era composta por três pessoas (28,9%). Dentre as que consomem mel, 87,1% o consomem e 12,9% não consomem mel. Quanto às refeições em que o mel é consumido, 59,83% preferem consumi-lo no café da manhã. Embora o consumo se dê no ano todo, o maior consumo ocorre no inverno (27,01%). Quanto ao tipo de embalagem que o consumidor prefere adquirir o mel, 55,93% preferem a embalagem de vidro e 36,89% preferem a plástica redonda. 67,33% dos entrevistados consomem o mel mesmo estando cristalizado, pois para estes, mel cristalizado não significa mel de má qualidade. Concluiu-se que este trabalho foi uma importante ferramenta para avaliar a intensidade de consumo do produto no município, bem como reconhecer as principais exigências dos consumidores.

Palavras-chave: mel, mercado consumidor, associativismo.

INTRODUÇÃO

A apicultura brasileira vem passando por distintas e marcantes fases, desde a sua implantação em 1839 (VILCKAS et al., 2001). Segundo esses autores, a apicultura possui um potencial que ainda precisa ser explorado, e entre eles encontra-se a indústria apícola, que vem se destacando pela variabilidade e qualidade de seus produtos e pelo aumento de produção dos produtos das abelhas.

VILCKAS et al. (2001) afirmam que embora existam aspirações a favor da apicultura para que ocorra um melhor aproveitamento e exploração da atividade apícola no país, deve-se, além do incentivo ao aumento da produção, desenvolver a parte final da cadeia apícola, ou seja, trabalhar a forma que o produto chega ao consumidor final. Para que isso ocorra, além do desenvolvimento dos meios de distribuição, é preciso estudar o perfil dos consumidores, objetivando conhecer as necessidades que esses possuem quanto ao produto, suas características produtivas e mercadológicas, além de conhecer e traçar as melhores estratégias e definir quais ferramentas devem ser utilizadas para melhor atender a essas necessidades.

O mercado brasileiro de consumo de mel é muito baixo comparado a outros países como os da Europa, em que o consumo per capita anual fica em torno de 1 quilo. Na Alemanha, por exemplo, o consumo é de 2,4 quilos por pessoa por ano. Já o brasileiro consome apenas 60 gramas de mel por ano (REVISTA RURAL, 2006). Um dos motivos para esse baixo consumo está no fato de o consumo ainda estar muito associado a questões medicinais (Icepa, 2003).

Em vista disso, realizou-se esse trabalho com o objetivo de traçar o perfil sócio-econômico e cultural dos consumidores de mel, em parceria com a Associação Cachoeirense de Apicultores (ACAPI), na zona urbana de Cachoeira do Sul/RS. Este foi desenvolvido para atender as dificuldades que os associados desta entidade vem enfrentando quanto a comercialização do mel, realizando assim, um levantamento da demanda, ou seja, pesquisando alguns entraves que vem ocorrendo no consumo do mel.

MATERIAL E MÉTODOS

O trabalho foi realizado na zona urbana do município de Cachoeira do Sul, distante 290 km da capital Porto Alegre e situado na região centro do estado do Rio Grande do Sul. A amostra foi de 349 consumidores escolhidos aleatoriamente em 33 bairros da cidade, que foi dividida em quatro quadrantes. A amostra representou 0,4% da população da zona urbana. Para a coleta das informações utilizou-se um questionário estruturado, com as seguintes variáveis: sexo, nível de instrução, composição familiar, consumo de mel, freqüência de consumo de mel, formas de consumo de mel, época de consumo de mel, formas de utilização do mel, tipo de embalagem e consumo de mel cristalizado.

A coleta de dados ocorreu no período de 06 de setembro a 10 de novembro de 2004, nos mais variados dias da semana e em diferentes horas do dia, buscando-se não influenciar a amostra.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Observou-se que, dos entrevistados, a maior parte era composta por mulheres (62,7%). Esse número superior de pessoas do sexo feminino se deveu ao fato das entrevistas terem sido realizadas, na maioria das vezes, nas próprias residências dos entrevistados, e as mulheres eram as pessoas que permaneciam maior período de tempo no lar.

Quanto ao nível de instrução (Figura 1), observou-se que a amostra foi representada por pessoas com 1º grau incompleto, seguido pelo 2º grau completo, além da presença não menos representativa de pessoas com 3º grau completo. Além disso, foram identificadas na amostra pessoas com escolaridades diferentes dessas como: 1º grau completo, 2º grau incompleto e pessoas com pós-graduação. Dessa forma, a pesquisa teve maior representatividade de níveis de escolaridade médios, em sua maioria.


Figura 1. Nível de instrução (%).

Quanto à composição familiar (Figura 2) observou-se que a maior parte das famílias era composta por três pessoas e, também, um elevado número de famílias com quatro pessoas e, quase proporcionalmente, famílias com duas pessoas. Portanto, a composição familiar foi de tamanho médio, correspondendo a quase 80% da amostra. Além disso, ocorreram casos de famílias com 5 pessoas, famílias com mais de 5 pessoas e pessoas que moram sozinhas.


Figura 2. Composição familiar (%).

Considerando-se a composição familiar, a grande maioria das pessoas consome mel (Figura 3), existindo, no entanto, pessoas que não o consomem por não gostarem ou por considerá-lo muito doce.


Figura 3. Consumo de mel (%).

A partir da observação de que existe uma grande parcela populacional consumidora de mel, buscou-se identificar a freqüência de consumo desse produto (Figura 4). Dentre as possibilidades de períodos de consumo foram observados os seguintes: consumo em período maior que seis meses, ou seja, consumo uma vez ao ano (raramente); consumo uma vez a cada seis meses ou algumas vezes, ou seja, num período maior que um mês até seis meses (às vezes); consumo uma vez por mês ou algumas vezes num período que varia de mais de uma semana até um mês (quase sempre); consumo de mel diariamente ou várias vezes na semana (sempre); e nunca consome. Sendo assim, os dados mostraram que a maior parte da população possui o hábito de consumir mel quase diariamente (sempre), o que correspondeu mais de 50% do total. Observou-se, também, uma parcela populacional que consome mel quase sempre ou somente às vezes, e ainda uma pequena, mas relevante percentagem de pessoas, que nunca consome mel.


Figura 4. Freqüência de consumo (%).

Dos resultados encontrados na freqüência de consumo observou-se que 68,08% da amostra consomem mel sempre, diferindo dos resultados apresentados por VILCKAS et al. (2001) que mesmo somando as freqüências "sempre" e "quase sempre" atingiu apenas 35,3% da amostra. Como conseqüência, verificou-se que o baixo percentual de pessoas que nunca consomem mel foi de 1,77%, bem distinto do observado em Ribeirão Preto, por VILCKAS et al. (2001), que apresentou um percentual de 25,2%. Portanto, verificou-se que, embora exista um grande percentual de pessoas que consome mel com grande regularidade, existe ainda uma parcela da população a ser "conquistada".

Identificada a freqüência de maior consumo de mel, observou-se de que forma esse mel foi consumido (Figura 5). Chegou-se a conclusão de que esse possuiu maior consumo no horário da manhã, correspondendo a mais de 50% das refeições. Já como acompanhamento de chá e de xarope correspondeu a mais de 20% das formas de consumo. Em menor freqüência, também foi consumido em lanches, puro e como medicamento, sendo esse último em menor quantidade. Ocorreu, ainda, uma parcela da amostra que não consome ou consome o mel de outras formas.


Figura 5. Formas de consumo do mel (%).

A forma de consumo do mel mais representativa em Cachoeira do Sul foi o consumo no café da manhã, com 59,83%. Já em Ribeirão Preto (VILCKAS et al., 2001), a principal forma de consumo foi a utilização como medicamento (36,5%), que concordou com os resultados encontrados em Taubaté (BENDINI et al., 2002), em que 67,88% da amostra utilizou o mel como medicamento. Em Cachoeira do Sul, o uso como medicamento foi o mais baixo percentual identificado, com apenas 2,47% da amostra. O segundo maior percentual foi a utilização em chás com 14,06%, justificado pelo fato de o mel ser bastante utilizado em períodos frios como adoçante. Já o consumo como xarope, em lanches, puro e outras formas de consumo ou de pessoas que não consomem mel foram de 8,04%, 4,94%, 3,71% e 6,95%, respectivamente. Pelo trabalho de Ribeirão Preto o consumo de mel puro alcançou valores bem mais significativos (28,2%).

Quanto à época de consumo (Figura 6), observou-se que o mel é consumido durante todo o ano, ou seja, sempre (67,26%). Porém, dentre as épocas definidas do ano (estações), observou-se que no inverno o consumo foi maior, com quase 30% do consumo.


Figura 6. Época do ano em que o mel é consumido (%).

Um trabalho similar a esse foi realizado em Santa Maria/RS por LENGLER & DIAS (2000). Os autores observaram que foi durante o período de inverno em que o mel foi mais consumido, considerando-se as épocas do ano (37,86%), atingindo um percentual um pouco maior que o encontrado em Cachoeira do Sul (27,01%). Conforme a Figura 6, foram observados percentuais baixos, indicando que 2,87% da amostra consome mel somente às vezes e 2,01% raramente, além disso, foram identificados na amostra valores de 0,57% e 0,28%, que correspondem a pessoas que não utilizam mel e a épocas indefinidas, respectivamente. Os entrevistados citaram como motivo principal para esta indefinição de períodos de consumo a falta de condições financeiras para adquirir o mel.

Quanto ao tipo de embalagem que o consumidor prefere adquirir o mel (Figura 7), a maioria prefere embalagem de vidro, com mais de 50% dos entrevistados, seguida pela embalagem plástica redonda com mais de 35%, e por último a embalagem plástica sextavada, além de pessoas que responderam que independe do tipo de embalagem em que o mel é vendido para o consumo.


Figura 7. Tipo de embalagem (%).

A amostra apresentou uma grande maioria de entrevistados, com 55,93%, que preferiram embalagens de vidro. Um dos motivos para esta escolha se deveu ao fato de existir uma cultura em torno desse tipo de embalagem, o que também foi identificado através das entrevistas estarem ligadas à crença de que o mel vendido nessas embalagens é puro. A embalagem plástica redonda foi a segunda mais citada, com 36,89% das amostras, e a plástica sextavada com 4,68% das amostras. No sentido geral, pouco difere dos resultados de LENGLER & DIAS (2000). No entanto, nesse trabalho se incluiu outro fator que tem uma parcela amostral a qual independe o tipo de embalagem que o mel vai ser comercializado, com 2,5%, salientando que, segundo entrevistas, o importante nessa questão é a pureza do produto e sua origem.

Um dos problemas encontrados na comercialização do mel em Cachoeira do Sul foi o fato do produto cristalizar (Figura 8). Por esse motivo, os entrevistados foram questionados quando à possibilidade do mel cristalizado ser consumido. Assim, identificou-se que a grande maioria dos entrevistados consome mel mesmo esse estando cristalizado, pois segundo eles, mel cristalizado não significa mel de má qualidade. Ao contrário, quase 20% acreditam que o mel não pode ser consumido e pouco mais de 10% consideram indiferente o consumo.


Figura 8. O mel cristalizado pode ser consumido (%).

Segundo PAIXÃO (1990), o problema da comercialização de mel cristalizado foi identificado dentre os apicultores da região Sudeste do país, pois a maioria dos consumidores desconhecia sobre a cristalização do mel e, desta forma, colocava em dúvida a veracidade do produto. Embora esse sendo um dado relativamente antigo, representou fielmente a realidade da parcela amostral composta pelas pessoas de Cachoeira do Sul que discordam de que o mel cristalizado pode ser consumido (20,52%). Já 68,62% acreditam que o mel cristalizado pode ser consumido, pois não pode ser classificado como mel de má qualidade somente por esse motivo, ou ainda ocorreram casos de entrevistados citarem que adquirem mel somente se este estiver cristalizado ou em processo de cristalização.

CONCLUSÃO

De acordo com os resultados obtidos pode-se concluir que o município de Cachoeira do Sul possui um consumo expressivo de mel, indicando uma porcentagem de aproximadamente 87% do total de entrevistados. Esse número torna-se ainda mais relevante ao considerar que destes consumidores, 68% sempre consome o produto. Quanto ao horário de consumo, o café da manhã representou a maior preferência dos consumidores, e quanto à forma de apresentação do produto, a embalagem de vidro representou ser a preferência da maior parte dos consumidores.

Considerando que é de suma importância o reconhecimento do mercado consumidor, esse trabalho constitui numa ferramenta para a criação de estratégias para estimular o consumo de mel e, consequentemente, promover o desenvolvimento da atividade apícola cachoeirense.

REFERÊNCIAS

BENDINI, J.N.; FARIA JÚNIOR, L.R.R.; BARRETO, L.M.R.C. Perfil do consumidor de mel do município de Taubaté. In: Congresso Brasileiro de Apicultura, 14, 2002, Taubaté/SP. Anais..., Taubaté/SP, 2002.

Icepa - Centro de Estudos de Safras e Mercado. Apicultura orgânica é viável em áreas agrícolas. Disponível em: Acesso em: novembro de 2004.

LENGLER, C.B.; DIAS, R.D. Perfil dos freqüentadores de shoppings centers de Santa Maria quanto ao consumo de mel. In: Seminário Estadual de Apicultura, 5, Encontro de Apicultores do Mercosul, 1, 2000. Anais..., 2000.

PAIXÃO, M.V.S. Análise comparativa de 3 métodos de descristalização do mel. In: Congresso Brasileiro de Apicultura, 8, 1990, Santa Teresa/ES. Anais..., Santa Teresa/ES, 1990.

REVISTA RURAL. Abelha: aumento do consumo é estratégia dos produtores. 2006. Disponível em: . Acesso em: novembro de 2006.

VILCKAS M., et al. Perfil do consumidor de mel e o mercado de mel. Revista Mensagem Doce, n.64. Disponível em: Acesso em: novembro de 2004.

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